terça-feira, 3 de junho de 2014

Desejos

    “Lembro” do começo dessa“terra de Santa Cruz”, nossos “conquistadores” viviam de uma alteridade torta - alteridade é se importar com os outros (alter=outro) -, mas como os entendo, hoje se tivesse o poder que eles tinham, confesso, faria o mesmo! Sua alteridade era: “Amados Índios (o amada é meu), nós vos damos o catolicismo e vocês nos dão o ouro”.

     Ora, na mentalidade dos conquistadores, os Índios sairiam no “lucro” – o que é verdade, porque o próprio Senhor diz: “Buscai o tesouro que a ferrugem não corrói nem ladrão rouba” – Mas é uma alteridade torta, porque essa entrega que os “conquistadores” fizeram do tesouro, Cristo Jesus, era por interesse próprio.

     Ao pensar que faria o mesmo, é porque queria colocar o Senhor no coração do povo, como coloco sorvete de abacaxi na casquinha, mas não posso e nem devo. Se meu Senhor não deixa, é porque nada é tão bonito quanto algo que nasce da liberdade e da alegria da surpresa, alegria de achar o tesouro perdido, como fala Jesus (cf. Mt. 13, 44-46), certo homem o encontra e tem coragem de ir vender tudo pelo tesouro encontrado.

    Diante de tamanho desânimo – meu desejo mina dele – tenho vontade de enfiar goela abaixo a alegria do evangelho. Desânimo esse por ver ou achar tanta coisa errada, tida como certa; tanto caos, uma desordem de valores... Mas, de repente, Deus me visita com a história de José do Egito (Gn 37-50), por isso o povo Judeu faz tanta memória das graças que Iavé já realizou no coração de sua história.

    Relembrar José dá ânimo ao coração abatido. José é o filho predileto do Jacó, certa noite sonhou que seus irmãos o reverenciavam de joelhos. Mas, após o sonho José foi jogado no fundo do poço, literalmente, vendido como escravo, preso... Mas, a providência de Deus usa até do mal que invade o coração do homem. Todo esse mal foi exatamente para que o sonho se tornasse realidade. O mal é servo do bem.

    “Deus não dorme nem cochila” (sl 37)
Na história de José, a sensação é como na atual realidade, tem-se a impressão de que o mal está vencendo, que por mais que se queira fazer o bem, ele parece tão pequeno...Mas aí mora a magia do bem: ele, por menor que seja, é maior do que qualquer mal. É necessário acreditar, ter a esperança, voltar a sorrir.

    Sorrir na esperança que Deus tem as coisas na rédea, sem deixar de respeitar a nossa liberdade,Ele tem tudo nas mãos, Ele faz o mal trabalhar para Ele. Recordo do Santo Padre Pio, que dizia: o mal é o bordado do lado de baixo, como uma criança que olha a mãe bordar, e por estar olhando por baixo do bordado diz: “Mãe!!! Que coisa mais feia que a senhora está fazendo” – mas ela volta a parte de cima para a criança e então ela se admira da beleza que a mãe está fazendo. Assim é conosco, com nossa vida, em muitos momentos olhamos por baixo, mas Deus sempre olha por cima!


    Sei da dificuldade de confiar quando tudo parece perdido. Olhar as coisas do avesso sem ter a esperança de que há outro lado e que ele é o lado certo, o lado que devemos contemplar e ter a certeza que Deus costura a trama dos dias e faz de nossa liberdade, mesmo que mal usada, um bordado tão bonito. E por mais que só consigamos ver o emaranhado de fios soltos e sem sentido, é preciso se abrir à surpresa de Deus, é preciso não se deixar vencer. Porque José do Egito é o mundo, os desencontros de nossa história nunca poderão estragar a arte, o belo bordado tecido fio a fio pelas mãos divinas.

AlanVeloso

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